quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

As Doze Tribos (trecho de A Marca Escarlate)



            - Anáira, você será apresentada a todas as Doze Tribos, agora com todos em sua forma real, que lhe trarão suas futuras armas, as quais deverão ser as únicas que você poderá usar, além da magia. – Voltando-se aos presentes, Maíra ordenou: – Que se apresentem os representantes de cada tribo...
            Agora, em sua nova forma, Anáira procurava pelos casais de anciãos e pôde perceber que eles também estavam transformados, pois nem todos tinham uma aparência humana, e suas roupas também diferiam daquelas utilizadas na celebração da noite passada.
            Logo a seguir, um a um, os casais aproximaram-se da Mesa levando os presentes relativos às suas Tribos e se apresentando individualmente.
            Os primeiros a se apresentar eram criaturas muito menores que os demais, mas não propriamente anões. Ambos usavam chapéus muito parecidos, com três pontas voltadas para frente, porém o dela tinha enfeites de tiras coloridas e pequenas estrelas. Possuíam a pele muito enrugada e de um tom cinza-esverdeado, narizes achatados, orelhas baixas e alongadas e olhos tristes, devido às pálpebras caídas nos cantos laterais. Apesar do aspecto estranho, tinham expressões incrivelmente bondosas, criando simpatia instantânea. Com uma voz grossa e metálica, a criatura masculina apresentou-se:
            - Somos Ariel e Andrasta, da Tribo dos Cétridos, que simboliza a Força Física, nós lhe trazemos A Espada Rúbea. Não se deixe impressionar por nossa pequena estatura. Amanhã, em nosso treinamento, você verá que as aparências enganam muito...
            Foram seguidos por um casal de aspecto bem humano, porém enormes. Tanto, que tiveram que manter-se curvados durante todo o tempo. Ali, perto dos cétridos, a diferença de tamanho tornava-se espantosa. Anna teve que olhar para o alto quando eles se aproximaram:
            - Oclasto e Ariadne, da Tribo dos Gigantes, trazendo-lhe a Coragem, na forma do Escudo de Mãos Livres. Seja bem-vinda!
            Logo atrás, um casal de idosos de pele ligeiramente azulada e formas longilíneas, vestes brancas e cabelos longos branco-prateados, disseram, com uma voz muito suave, pausadamente:
            - Tertúlio.
            - Hilda. Representamos a Tribo dos Etrúrios.
            Ele prosseguiu:
            - Ensinaremos a Confiança, e lhe ofertamos uma Trombeta. Você, em pouco tempo, saberá quando usá-la...
            Anáira sentiu então uma brisa perfumada, como se recebesse flores, mas não havia nada nem ninguém a sua frente. Apertou os olhos e viu duas formas diáfanas, como se estivesse vendo águas-vivas em um aquário. Aos poucos, estas tomaram formas alongadas, do tamanho de pessoas, e materializaram-se um arco e um conjunto de flechas bem à sua frente, quando pôde ouvir sons, como silvos, que diziam:
            - Somos Amon e Hasta, da Tribo do Ar. Representamos a Transcendência, e lhe ensinaremos o uso do Arco e Flecha.
            Vieram a seguir um homem e uma mulher belíssimos, de tez muito clara, quase luminosa, ambos louros e de cabelos muito longos, com olhos azuis claríssimos penetrantes e orelhas afiladas. Trajavam longas capas e quase não se podia distinguir qual o masculino e qual o feminino. Um deles apresentou-se, com voz melodiosa:
            - Asgard e Zorr, Tribo dos Elfos. Representamos o Amor por todas as criaturas e lhe trazemos a Capa Indelével.
            O próximo casal parecia de indígenas, em vestes de guerra, muito morenos e com corpos fortes e pintados. O homem apresentou-se com uma voz gravíssima:
            - Haoni e Mani, da Tribo da Terra. A Disciplina é a virtude no uso do Machado. E fizeram uma saudação - “Hai!”            
            A Grande Guerreira repetiu a saudação – “Hai!”
            Repentinamente uma enorme figura alongada de chamas vibrantes veio serpenteando em sua direção e, ao se aproximar de Anáira, tomou a forma de uma face em cada extremidade e uma voz calorosa vibrou no ar:
            - Salma e Andro, somos dois em um, simbolizando a Tribo do Fogo, cuja Virtude é a Fidelidade. Guarde sempre esta Chama que Nunca se Apaga consigo – e lhe deu uma pequena chama que se desfez nas mãos da presenteada, sem, entretanto, queimá-la.
            Anáira não entendeu o significado daquele presente. Então a serpente de fogo fez vibrar o ar novamente, ao dizer:
            - Muito em breve você aprenderá sua utilidade!
            A seguir, o casal que ela já conhecia, Nágila e Hermes, da Tribo Universal, lhe trouxe um raio de luz azul, o Raio Cerúleo. Eles iriam lhe ensinar a Paciência.
            Vieram ainda Atheléa e Vetusto, da Tribo Atlante, o povo da Sabedoria, caracterizados por seus crânios alongados para trás, para acomodar seus cérebros avantajados. Trouxeram a Anáira um grande e pesado livro – o Código Atlante.
            Estes deram lugar a saltitantes criaturas que se assemelhavam às crianças humanas, com grandes olhos e largos sorrisos, trajes coloridos e bufantes, pêlos curtos sobre todo o corpo e rodeados por pequenos pássaros, borboletas e animaizinhos que corriam em seu entorno. Eram Beladucadro e Brosingamene, da Tribo da Alegria, os Híbridos. Seu presente foi um Espelho.
            Um homem e uma mulher de meia-idade, trajados sobriamente, se apresentaram a seguir:          
            - Somos André e Elza, da Tribo dos Homens Virtuosos. Vamos ensinar-lhe e Perseverança e lhe oferecemos esta Ampulheta.
            Anáira ainda guardava o objeto atrás de si quando uma onda gigante invadiu o corredor central e ela instintivamente abaixou-se e respirou fundo, segurando o ar. Mas a água estancou-se diante dela e dividiu-se em duas figuras paralelas. De uma delas, partiu uma extensão, como uma mão, que lhe deu uma garrafa de vidro com uma estrutura metálica trançada em volta e repleta por um líquido transparente. Uma voz gutural saiu da outra das figuras líquidas:
            - A Tribo das Águas lhe oferece o bem mais sagrado que existe, a Água Pura. Somos as Ondinas e a Cautela será nossa lição.
            Anáira já não via outro casal. À sua frente aproximou-se Maíra. Antes mesmo que houvesse tempo para perguntas, ao lado dela materializou-se um idoso senhor, de cabelos e barbas brancos e longos, com o corpo tatuado como o da velha senhora, e com muitas marcas do tempo no rosto e em toda a pele. Ambos se postaram defronte àquela há muito esperada e a saudaram com uma grande reverência. O homem apresentou-se:
            - Querida Irmã, sou Verastro, companheiro de Maíra. Já não pertenço mais a esta dimensão, mas estarei aqui sempre que necessário. Como você já deve ter percebido, somos da Tribo Escarlate. Conosco você terá lições de Magia. Guarde consigo esta Cuba de Pedra. Será seu bem mais precioso.
            Ambos lhe pegaram as mãos e, apertando-as com vigor, imaginaram palavras que Anáira estranhamente pôde ouvir e entender. “Sim, Irmã, você pode ouvir o que pensamos e nem precisa de treinamento para isso. Que você cumpra bem sua Missão, estaremos todos com você.”
         

domingo, 3 de fevereiro de 2013

O que está por trás da heroína de Andrágona?


Parece incrível, mas no século XXI quase  não temos heroínas em nossas estórias. Mesmo com a História repleta de mulheres que fizeram e fazem coisas grandiosas, são os elementos masculinos que dominam a literatura infanto-juvenil. No máximo, há personagens femininos secundários ou sem relevância.
Na literatura adulta que faz sucesso na atualidade e na mídia é ainda pior. As mulheres não passam de sedutoras, atreladas a um homem de sucesso e se submetendo aos seus caprichos, ou exibindo seus corpos em propagandas de cerveja.
Então, seremos ainda somente isto? Fêmeas reprodutoras que podem ser subjugadas pelo sexo oposto? É mesmo esta imagem que queremos que nossas filhas, sobrinhas ou amigas tenham de si mesmas? Espero e acredito que não.
A Marca Escarlate traz uma heroína que poderia ser qualquer adolescente de quinze anos, com suas dúvidas e inseguranças. Se a heroína Anáira atravessa portais para um mundo paralelo para tornar-se uma grande guerreira, é uma forma de identificação para cada uma de nossas jovens, que podem vencer seus medos, barreiras e inimigos obscuros, apenas acreditando em si mesmas e vencendo estereótipos.
Há também jovens heróis que se tornam mais importantes com o decorrer da estória, idosos e idosas heróis, seres dos mais diversos aspectos que se tornam heróis, animais fiéis que são heróis naturalmente. O mundo fictício de Andrágona é um paralelo com nossa própria realidade e que mescla elementos os mais variados, mostrando que é possível a diversidade de aparência, de gênero e de cultura conviver pacificamente e lutar pelo bem comum, como heróis reais do dia a dia.
É ficção e aventura, mas que busca fortalecer a ideia de o que respeito ao próximo e a luta pelo bem comum podem estar em qualquer indivíduo, seja ele quem e como for. E, principalmente, busca fortalecer a imagem feminina, na forma da jovem heroína, para que ela reflita as possibilidades para nossas adolescentes crescerem sabendo que são muito mais que um rosto bonito ou um corpo a ser exibido. Sabendo que têm tudo para serem heroínas possíveis e não as imaginárias como mulher-gato ou maravilha.
Sem pregar feminismos ou levantar bandeiras, a proposta é de, como são as mulheres que geram e em geral educam todos ou outros homens e mulheres, termos todos a consciência de que a imagem feminina fortalecida e ciente de sua importância no contexto da sociedade, trará somente benefícios para a humanidade, colaborando para que a virtude vença na eterna luta do "Bem contra o Mal".